sexta-feira, 6 de abril de 2012

Folhetim 3 - O Mendigo e a Psicóloga


"...Ao ser questionado pela psicóloga sobre onde morava, foi sincero consigo mesmo pela primeira vez e disse a ela que estava em situação de rua, e que passou dias dormindo numa lixeira. A profissional questionou a fim de saber se era verdade e ele, sem cerimônias contou um pouco de sua vida.
A doutora ficou muito impressionada com sua história. Como poderia um grande mecânico de avião, que já fora empregado em grandes empresas, conhecedor de vários países, poliglota que, com apenas trinta e poucos anos já se encontrava numa situação de mendicidade? Ele não admitiu a ela que era um alcoólatra, mas em partes porque também não sabia. A psicóloga ficou com a pulga atrás da orelha e fez mais uma pergunta:
-- Como pode morar numa lixeira e estar aqui perfumado e com camisa limpinha, lendo um livro?
Olhando para os belos olhos verdes da moça, Hildebrando revelou que ganhara de um paciente que já tinha recebido alta, e que suas roupas velhas estavam guardadas em um saco de lixo dentro do banheiro. Ela foi até a lixeira para constatar a dura realidade do pobre coitado. Ao finalizar seu questionário, comunicou-lhe de que o médico que estava que cuidava de seu caso viria no dia seguinte por volta das 10 da manhã, para conversar com ele sobre quando receberia alta. A psicóloga, ao dirigir-se a porta, desejou-lhe boa leitura, mas antes que saísse ouviu a voz de Hildebrando:
-- Por gentileza, posso lhe fazer uma pergunta antes que se vá?
A psicóloga, surpresa respondeu:
-- Pode sim, imagina!
Hildebrando, meio vacilante, continuou:
-- Você é bonita assim mesmo ou fez cursinho?
A cantada boba do mendigo balançou a mente da psicóloga, deixando-a sem jeito, apesar de saber que era bonita. Sem saber como sair da sinuca de bico, desejou novamente boa leitura ao mendigo e antes que fechasse a porta, Hildebrando conseguiu retrucar novamente:
-- Doutora, se tiver em sua casa algum livro velho de Sigmundo Freud, Jean Piaget, Carl Jung – todos da área da psicologia – ou alguém da sociologia como Emile Durkhein, Mar Weber, Celso Furtado, por favor me traga.
Ali ele exibiu sua cultura decoreba e, é claro, impressionou muito aquela profissional. A psicóloga fechou a porta sem dizer sim ou não, pois não queria dar confiança aos pacientes. Já teve muitos problemas no passado por dar muita atenção e amor aos pacientes mais carentes. Infelizmente eles, às vezes confundem, ao verem uma linda mulher morena de olhos verdes, esguia lhe tratando com carinho. Ela já estava acostumada com galanteios de médicos a mendigos, dentro e fora do hospital, mas já estava vacinada.
Hildebrando voltou à leitura e após o almoço, tirou uma soneca a fim de recompor-se, já que estava sozinho no quarto. Acordou somente no horário do café, com um simpático “Olá” das enfermeiras, convidando-o a acordar-se para os medicamentos e tomar um nescauzinho. Enquanto tomava seu chocolate quente de hospital, chegou uma maca com um paciente todo quebrado. Seria um novo companheiro de quarto?..."

Este é um fragmento do livro Diário de Bordo da Kombi, escrito por Paulo Roberto de Souza que será publicado em breve.

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